Rubem Alves: educação no Brasil vive o “pacto da mediocridade”.
Uma das maiores demandas da população, requisito fundamental do desenvolvimento e um direito constitucional, mesmo assim a educação continua a ser um dos piores serviços do Estado. Em praticamente todo o Brasil, o desempenho da escola pública é fraco, para dizer o mínimo. A atuação dos políticos e dos professores apenas denuncia o pacto que permite a perpetuação da mediocridade.
As observações são de Rubem Alves, psicanalista, professor emérito da Unicamp, bacharel em Teologia e Pedagogia, mestre em Teologia pelo Union Theological Seminary em Nova Iorque, doutor em Filosofia e autor de mais de 50 títulos voltados para adultos e crianças, muitos dos quais com enfoque na vocação do professor. Ele foi um dos destaques do 5º Educasul realizado no final de semana em Florianópolis com a presença de aproximadamente mil educadores procedentes de 197 regiões do país. Promovido e organizado pela Capacitar Eventos Educativos, com apoio institucional da Undime, Anec, Sou do Bem, Sinepe/SC e CDI, e incentivo do Funturismo, Governo do Estado de SC, Direcional, Jornal da Educação, Petrobrás e Governo Federal, a 6ª edição do Educasul já tem data anunciada: acontecerá de 21 a 23 de julho de 2010 no mesmo Centrosul, em Florianópolis, segundo informou Jessé Torres, organizador do evento.
Avaliação: desafios e perspectivas
A conferência de Rubem Alves encerrou o Educasul 2009 após três dias de discussões através de mini-cursos, mesas-redondas, oficinas, painéis, palestras, convidados ilustres de várias partes do planeta e educadores de todo o país.
No primeiro dia de atividades o conferencista espanhol Miguel Zabalza alertou que a educação no Brasil deve abandonar velhos valores. Ainda neste dia ocorreu a apresentação de três mini-cursos e a visita a Feira do Aprender. Entre os destaques da feira, o Objetivo – Sistema de Ensino, a Editora FTD e a Petrobras que apresentou o Conpet – Programa nacional da racionalização do uso dos derivados do petróleo e do gás natural.
Ação Social
Também esteve presente no Educasul o Instituto Lagoa Social que, entre outros projetos, atua dentro das escolas com ações esportivas e culturais para tirar as crianças das ruas. Segundo Gustavo Soares de Aguiar, que trabalha na ONG, “nossas ações são complementares, visando crianças de comunidades carentes que ficam ociosas fora do horário escolar. Em parceria com os colégios desenvolvemos atividades como futebol, tênis e judô além do Projeto Pipoca que leva cinema a molecada e vice-versa”. Para maiores informações entre no site www.lagoasocial.org.br
Formação
No segundo dia de evento uma mesa-redonda agitada onde a palestrante Alessandra Arce levantou os desafios de se ensinar na Educação Infantil e a professora Zoia Ribeiro Prestes alertou que os professores devem se aprofundar mais na teoria. Na mesma linha de pensamento, o francês Eric Plaisance frisou que nosso país precisa melhorar, e muito, a formação dos professores. Por sua vez, o conferencista Cloves Amorim chamou a responsabilidade em sala de aula para os professores, “nós encantamos os alunos ou não”.
Oficinas
O segundo dia ainda reservou oficinas que trataram de diversos temas. Entre eles, Literarte, ministrado por Pricilla Cristine Trierweiller. “Antes de discutirmos o espaço da literatura e da arte no cotidiano pedagógico das escolas, devemos examinar a formação do professor. Se o professor não tem uma formação adequada de base, dificilmente ele consegue trabalhar isso com as crianças. A arte e da literatura devem ser vistas como princípio da formação humana e isso precisa estar bem claro para o educador”.
– Na educação infantil costuma-se usar a arte para ensinar outras disciplinas, mas eu considero a arte como produção humana e não um instrumento para se ensinar isso ou aquilo, completou.
Pricilla trabalhou a materialização do uso da literatura e da arte na educação infantil; as relações entre teoria e prática; o espaço da estética e da arte e a linguagem artística.
Mesa-Redonda 2
O último dia reservou grandes atrações, como a conferência de encerramento de Rubem Alves, e começou agitado com uma mesa-redonda e um painel.
O Direito De Aprender
A criança deve ter seu direito à educação respeitado, com oportunidades de acesso, permanência, aprendizagem e conclusão da educação básica. A UNICEF, Fundo das Nações Unidas para a Infância, mantém um Programa de Educação coordenado no Brasil por Maria de Salete Silva, que nos explica porque a UNICEF não tem um escritório na região sul de nosso País. “Procuramos ter bases onde as desigualdades sobre os direitos são maiores, mas isso não quer dizer que não estejamos atentos ao Sul. Semana passada uma colega nossa esteve no Rio Grande do Sul e hoje estamos aqui em Santa Catarina para discutir como anda o direito de aprender da criança brasileira”. .
– Nós não nos baseamos apenas pelas ‘médias’. A média de crianças com seus direitos atendidos aqui na região sul é melhor do que em outros Estados, mas isso não quer dizer que todas as crianças estão sendo atendidas. Outro ponto importante é a permanência destes direitos, que não podem ser passageiros, completa Maria.
O fundo se preocupa com cada criança e incentiva políticas públicas que possam garantir o acesso à educação de todas elas. “Identificamos que um dos núcleos mais prejudicados com relação ao seu direito de inclusão na escola é o de crianças com algum tipo de deficiência. E isso não é maior em uma região ou outra, mas é uma questão da condição da criança e da falta de oportunidade que ela está recebendo”, continua ela.
– Nossas preocupações também se estendem aos adolescentes, porque no Brasil inteiro estamos com baixo acesso ao Ensino Médio. Na maioria das vezes é preciso estudar a noite e há uma desvinculação entre o Ensino Médio e o projeto de vida deles, como se eles não se preparassem para a vida na escola, indo apenas por obrigação. Devemos incluir o Ensino Médio neste projeto e fazê-lo como um dever, conclui.
Painel
Um desafio para pais, alunos e professores
Um tema tão atual e importante quanto o Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade precisaria ser debatido com todo o cuidado e nada melhor do que trazê-lo ao Educasul. A pedagoga Márcia Fiates, que tem formação em Psicopedagogia Clínica e Psicodrama, é fundadora e vice-presidente do Instituto Crescendo e Aprendendo e nos falou sobre o assunto: “Nós vemos uma necessidade muito grande de abordar e compartilhar este tema com os educadores, porque eles, junto com os psicólogos, podem identificar o problema e efetivamente ajudar a criança”.
– O mais importante é fazermos um diagnóstico preciso para saber, de verdade, quem tem o problema, senão fica tudo no censo comum. ‘Uma criança tem menos limite, então tem TDAH’, não é assim que funciona, completa Márcia.
Pesquisas recentes apontam que a TDAH atinge de 3 a 5% da população e essa incidência independe de classe social. “Numa turma com 20 alunos a média é de três casos” sinaliza Maria Cristina Brincas, psiquiatra e especialista em Psiquiatria da Infância e Adolescência. “O papel da escola é fundamental no processo, pois o diagnóstico só é feito através de uma avaliação clínica, mas só quem pode perceber os primeiros sintomas são aquelas pessoas que participam do convívio da criança, ou seja, pais e professores”, finaliza ela.
Apresentação de trabalhos
Com o objetivo de disseminar cada vez mais a educação e seus temas relacionados, o Educasul abre espaço para a apresentação de trabalhos acadêmicos e para grandes ideias.
Um desses trabalhos foi apresentado pela mestranda Marelenquelem Miguel que fez um recorte de sua dissertação falando sobre a escolarização da infância e a análise dos materiais utilizados na Educação Infantil. “Acredito que a criança pode contribuir para o processo de aprendizagem trazendo para a escola todo tipo de conhecimento já adquirido e não só se limitar ao preenchimento de questões iniciadas e pré-estabelecidas pelos professores”, comenta.
Outra ideia que surgiu nas apresentações veio do oeste do Estado e foi trazida pela Secretária de Educação de Chapecó, Astrit Maria Savaris Tozzo. “A Estância Ambiental surgiu abrindo um espaço diferenciado para as crianças da rede de ensino municipal. Dentro da Escola Agrícola da cidade recebemos diariamente grupos de até 80 crianças que contam com refeições e várias programações voltadas para preservação do meio ambiente”.