Até o momento, quem sabe ofuscadas pela síndrome da gripe A, as lideranças econômicas de Florianópolis não se arriscaram ainda em fazer previsões para o turismo do próximo verão. Eu prefiro limitar-me a uma avaliação do que a Ilha deixou de resolver em relação aos problemas da última temporada, e quais as perspectivas para a vinda de turistas.
Por Laudelino José Sardá
Falar em mobilidade é bater em ferro frio. Deixo para o alcaide Dário Berger superlativar a Ilha lá no exterior, onde as nossas fotografias impressionam pela beleza natural de nossa cidade. Pena que as fotos digitalizadas não exalam o fedor do rio do Brás, de Canasvieiras, e nem dos mangues, a mais expressiva reserva natural que o próprio ilhéu desconhece, espantado talvez pela catinga que ele mesmo provoca, ao despejar todo o esgoto nesse viveiro de peixes e crustáceos.
Prefiro comentar a imobilidade da Ilha, tanto no que se refere à dificuldade de deslocamento quanto à inércia do poder público em remover os entraves da qualidade no processo de crescimento.
Estamos a quatro meses do início da nova temporada de turismo e tudo indica que os problemas se multiplicaram. Os rios continuam poluídos e vamos torcer para que chuva com vento sul não rompa a barreira de areia que impede as águas podres do rio do Brás de contaminarem ainda mais o mar de Canasvieiras. A ligação poderia ser normal se as águas do rio fossem límpidas, ensejando, quem sabe, passeios de barco, uma atração diferente. Mas isso não sensibiliza o alcaide, que prefere asfaltar ruelas, construir viadutos, que são eleitoralmente mais vantajosos.
Ora, ora, se o turista vem comer, beber e banhar-se, por que se preocupar com mangues, rios etc.? Nem é preciso inquietar-se com as águas do mar, porque placas indicando-as propícias ao banho são suficientes, mesmo que mintam, não é mesmo? O importante é receber o turista com asfalto, viadutos, arranha-céus, etc., tudo espetacularmente moderno
Os nossos homens públicos ainda acusam a FIFA de manobras por deixar Florianópolis fora da copa de 2014. Se não conseguimos, com soluções fáceis, preparar a ilha para a temporada de verão, como então arquitetá-la com monumentais estádios, metrô etc., que exigiriam, no mínimo, R$ 4 bilhões de investimentos? Pura fantasia! A Ilha não precisa apenas de recursos financeiros. Necessita, sim, de consciência e determinação dos seus dirigentes, principalmente do alcaide.
Vou revelar um fato que é arrepiante e que acusa o desleixo e a incompetência dos governantes. O PAC (Programa de Aceleração do Crescimento, do governo federal) contemplou as cidades de São Francisco do Sul, Joinville e Laguna com recursos destinados à cultura, para a recuperação de monumentos históricos. Florianópolis ficou de fora porque não apresentou sequer um projeto. Simplesmente perdeu R$ 10 milhões.
Além disso, há outro fato hilariante. A Praça XV e a Praça da Alfândega, que fica ao lado do mercado público, permanecem em estado de abandono. Na Alfândega, por exemplo, há traficantes que chegam a arrancar paralelepípedos para esconder a droga. As empresas Koerich e o Sindicato dos Pesqueiros se propuseram a restaurar, enriquecer e a cuidar as duas praças, ou seja, pediram autorização para adotá-las, sem custo para a prefeitura. O alcaide, contudo, negou-lhes a atribuição, alegando que as duas praças são monumentos que precisam ser mais bem planejados. Concordo. Os balneários também precisam ser melhorar estruturados, da mesma forma a humanização do centro da cidade; concordo que também a ilha precisa de um parque, de mais equipamentos de lazer, aliás, a cidade precisa de muita coisa. Tudo em nome de ricas estruturas, na visão do senhor alcaide, é claro. Mas, pelo visto, de uma temporada de verão à outra que se aproxima, tudo piorou; nada foi feito
E como será a próxima temporada?
Com certeza a gripe A não irradiará motivo para o turista deixar de passar o verão na Ilha, até porque o vírus amolece em dias quentes. Contudo, a falta de opção de lazer e a sofreguidão provocada pelos constantes engarrafamentos, além de praias sujas, lotadas de cachorros, vendedores ambulantes, continuarão sendo fontes de desânimo. Você, leitor, lembra dos dias de verão com chuva e vento sul? Se não ficou em casa teve outra bela opção: passear no shopping, não foi? Agora está melhor ainda: são três shoppings, o suficiente para abrigar 50 mil turistas. E o restante? É só ensinar o caminho de Blumenau, Balneário Camboriú, Itapema, Joinville, São Francisco do Sul, Laguna.
Por falar nisso, em um raio de 250 quilômetros, a partir de Florianópolis, há mar, rios, serra, águas termais, etc.etc. Uma riqueza incomensurável. Na Europa, em um raio de 1.500 quilômetros, come-se, bebe-se e visitam-se museus, teatros, espetáculos. Mas somos pobres de visão e de espírito. Cada prefeito isola-se com a sua estratégia eleitoral e pouco está se lixando para o desenvolvimento social e econômico integrado.
Há 20 anos que o período de agosto a dezembro é reservado a lamentações. A prefeitura silencia-se por falta de justificativas ao abandono de balneários, aos precários acessos às praias e à ausência de organização do comércio e serviços, enquanto empresários são incapazes até de arrumar o passeio em frente aos seus negócios. Os discursos continuam os mesmos, que serão repetidos em 2010, 2013, 2014, até finalmente descobrirem que a Ilha já carece de oxigênio e que corre o risco de se tornar inviável, por múltipla falência da sua natureza. Ainda dizem que sou pessimista. Não! Estou, como sempre estive, irrequieto e preocupado com a nossa Ilha.