A demagogia, o populismo e a ideologia pobrista comandam a ocupação da cidade
No acender das luzes de seu primeiro mandato, Dário Berger contrariou o Ministério Público para atender pressões dos “movimentos populares”, liberando ligações de água e luz para mais de 5 mil edificações irregulares em toda Ilha (originadas do sistemático parcelamento clandestino das glebas manezinhas). Como se tratava de um “problema social”, os serviços eram furtados com gatos e gambiarras.
Na reta final do mandato, em janeiro de 2008, ao ser questionado sobre a inoperância da fiscalização da SUSP – Superintendência de Urbanismo e Serviços Públicos, Berger garantiu que lançaria “nos próximos dias” uma grande força-tarefa para coibir a ocupação clandestina da cidade. Ele destacou que “não é o prefeito que não funciona”, mas sim a fiscalização, “viciada e muitas vezes corrupta”. A tal força-tarefa ficou no dito pelo não dito e a fiscalização de rotina, viciada e corrupta ou não, continuou pífia. Já passam de 70% as unidades residenciais irregulares na cidade. Entre os estabelecimentos comerciais, 80% funcionam em imóveis sem habite-se, mediante alvarás provisórios – os “ex-oficios”. Agora, início do seu segundo mandato, Berger encaminhou à convocação extraordinária da Câmara um projeto para regularização de construções irregulares, um sobre a necessidade de estudo de impacto de vizinhança para novos licenciamentos e outro de paralisação da indústria formal da construção civil na Bacia do Itacorubi, curral eleitoral do vice-prefeito.
O vice-prefeito
O vice de Dário Berger, João Batista Nunes, começou a carreira política como liderança de “movimentos sociais”. Já foi até presidente da UFECO – União Florianopolitana de Entidades Comunitárias. Foi membro do PDT de Brizola, que deu o empurrão que faltava para transformar a Cidade Maravilhosa na capital nacional das favelas.
Façamos vistas grossas, por enquanto, aos inúmeros projetos de alteração de zoneamento do ex-vereador. Num levantamento feito sobre as famigeradas leis ordinárias de denominação ”ex-oficio” das vias (servidões) abertas à revelia da legislação pelos loteadores clandestinos das glebas manezinhas, João Batista está entre os vereadores campeões dessa excrescência – uma espécie de sociedade informal entre loteadores clandestinos, seus clientes e os nobres edis – que têm recebido veementes condenações dos técnicos do tão criticado IPUF – Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis e do Ministério Público. No curto período de janeiro de 2005 a julho de 2006, por exemplo, JB aprovou cerca de 30 projetos de denominações dessas servidões, “requeridas” pelos moradores mediante abaixo-assinados. Os projetos são justificados com prosélitos como o direito dos moradores a endereço para correspondência e comprovantes de residência para crediário. Apenas esses 30 projetos correspondem a 4,5 Km lineares de vias em parcelamento clandestino de solo em doze bairros da cidade – inclusive na saturada região da Bacia do Itacorubi. Isso dá algo em torno de 300 unidades habitacionais, se considerada a testada oficial de 15 metros. Como sabe-se que, na prática, a regra é dividir os lotezinhos em bem menos do que isso, a quantidade pode chegar a 400 ou mais unidades. No relatório da Câmara de março de 2008 já havia outros 20 projetos desses, de João Batista, em tramitação.
Imbróglio indecente
Depois da “oficialização” pela Câmara, os clientes dos “empreendedores” de servidões clandestinas são brindados com dotação de infraestrutura em suas propriedades, às custas da Prefeitura Municipal, Casan, Celesc. A PMF executa até a pavimentação (responsabilidade dos loteadores) dos leitos das vias – onde muitas vezes mal passa um carro por vez – e dos passeios públicos (uma responsabilidade dos adquirentes dos lotes). Calçadas, é claro, se os proprietários concordarem em devolver o espaço que, de regra, colocam para dentro dos muros de suas propriedades privadas. Se não concordarem, não tem problema. Nada acontece, porque o eleitor sempre tem razão. É ou não é um imbróglio indecentemente demagógico e populista, envolvendo o poder público com os negócios escusos dos loteadores e construtores clandestinos?
Foi dentro desse esquema que João Batista laborou objetiva e diretamente para “consolidar” no mapa da cidade, em um mesmo período, muito mais unidades habitacionais do que muitos dos donos de construtoras estabelecidas que, segundo Dário e seu vice, precisam ter sua atividade atravancada pelo projeto de moratória, e ainda mais dificultada por rigorosos estudos de impacto de vizinhança.
Resumo, em bom português: prestigiam e aliam-se a quem atua fora da lei. Constrangem e tentam expurgar quem trabalha de acordo com ela.
Aracruz e transgênicos
A ideia de moratória para a construção civil em Florianópolis não é nenhuma novidade. Há anos ela vem passando de mão-em-mão na Câmara. Mas a ideia original tem o DNA do aparato sócio-ambientalista: os “movimentos sociais” (entidades comunitárias, sindicatos e movimentos informais) e a tal da “sociedade civil organizada” (ONGs e assemelhadas). Ambos, como se sabe, são os braços militantes de partidos esquerdopatas, promotores da “função social” de todas as coisas e detentores do monopólio de saber – e decretar – o que é melhor para todos nós. O mesmo grupo que promove uma reforma cultural politicamente correta na cidade, travestindo a palavra empresário com significados de encrenqueiro, trambiqueiro e criminoso, e transformando a palavra negócio – não os da turma deles, é claro, que “funções sociais” – em sinônimo de estelionato e negociata.
A reivindicação da moratória foi encampada como bandeira pelo segmento revolucionário do Núcleo Gestor do Plano Diretor Participativo. Aquele mesmo da Investida Totalitária sobre Florianópolis (leia na edição 50 – Novembro de 2008 ou no site do Ilha Capital: www.ilhacap.com.br/edicao_novembro08/investida_totalitaria_nov08.html).
Nunca é demais chamar a atenção dos desavisados: a preocupação dessa gente não é com urbanismo ou ecologia. Essa é uma camuflagem de vigarice intelectual, para fazer crer que suas opções e “lutas” são moralmente superiores. O negócio deles são as revoluções proletárias. Suas demandas são contra o “maldito capitalismo” e seu alvo são as grandes empresas, a quem querem impor prejuízos. Se possível, a falência.
Empreendimentos imobiliários, como Jurerê Internacional e Costão Golf, são a Aracruz de Floripa. Os residenciais planejados da Fiori e os prédios de apartamentos da Cota são as plantações de soja transgênica da Ilha da Magia. É ressentimento coletivista contra o sucesso e a prosperidade alheios, em estado puro.
Reforma urbana!
Vivemos, na Ilha-Capital, os primórdios da “reforma urbana” já instalada no Rio de Janeiro, Porto Alegre, São Paulo. Falta pouco para pintar por aqui uma filial do MSTU – Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto Urbano: os seus abrealas já estão estabelecidos e atuando na Ilha, faz tempo. O pretexto é a defesa de direitos humanos e a proteção ambiental. Mas o alvo é mesmo a propriedade privada “burguesa”. Repare bem: essa gente não trabalha para reduzir a miséria. Nem para impedir ou remover a ocupação informal de dunas, encostas e beiras de rio por favelas! Onde se esconde tanta preocupação com meio ambiente e regras urbanísticas quando o assunto é a estética arquitetônica do barraco e da lajezinha “dozoprimido” e “dozescruido deçepaíz” em áreas públicas e de preservação? Quem vai fazer estudos de impacto de vizinhança nas dunas de Ingleses, nas margens do rio Papaquara, em Canasvieiras, na “faixa de gaza” do Rio Vermelho e na vila Areias, no Campeche?
O município já têm leis boas e suficientes. O que falta é administradores públicos éticos e competentes para fazer cumprí-las, políticos e empresários corajosos para denunciar e combater este estado de coisas e redações não aparelhadas para alertar a opinião pública sem “isentismos” e “outroladismos”.
O projeto de moratória é um novo ataque contra o liberalismo econômico e o “maldito” capitalismo, num conluio entre o estado gigante aparelhado, demagogo e populista, e os seguidores de uma ideologia pobrista ultrapassada, que quer travestir a Ilha da Magia com o modelito Cidade Maravilhosa. A moratória é apenas mais uma das estratégias para barrar a legalidade e fortalecer no meio urbano a mesma hegemonia da clandestinidade que o MST luta com foice e martelo para estabelecer no meio rural. Como a pirataria também faz no segmento comercial e o narcotráfico diretamente sobre os indivíduos, na sociedade civil. São ataques estratégicos contra valores universais e seculares, como a propriedade privada e a livre iniciativa. E contra a própria democracia representativa, pelo achincalhamento e desgaste do Legislativo, com sua paulatina substituição pela democracia direta da ditadura das massas, do assembleismo soviético, dos conselhos e das audiências públicas para ouvir o povo, lá representado por quem? Bingo! Pelos mesmos de sempre, as lideranças dos “movimentos sociais” e da “sociedade civil organizada”.
Anote: está em curso uma combinação explosiva para repetir em Florianópolis a grande obra brizolista. E o tsunami dos processos eleitorais para governador e presidente da Nação vem aí.
Que Nossa Senhora da Conceição da Lagoa nos proteja.
Por Maria Aparecida Nery